O rei sentou-se na cama e leu os
jornais. Mais tarde trouxeram-lhe café; com pouco açúcar e um bolo de morango
bastante apetitoso. Comeu somente a metade, bebericou o café e olhou para os
empregados que fizeram cara feia enquanto o rei que não gostara do café
resmungava: “será possível que não se encontra ninguém que saiba trabalhar
direito”. Ficou na cama até tarde; levantou-se apenas na hora de jogar golfe. Começou
fazendo belas tacadas; na primeira bateu com tanta precisão que sorriu para si
mesmo. Mas logo se cansou, queria público, não podia jogar sozinho apenas ele e
um empregado que carregava o material esportivo.
O rei voltou para casa e foi
planejar as batalhas com seu general ao seu lado. O rei considerava o general um
verdadeiro hipócrita, via claramente a falsidade naquele sorriso morto. Entre vários
pensamentos o rei movia as peças de um tabuleiro de um lado para o outro; enquanto
o general dava sugestões. A mente da majestade divagava, pensando em diversas
possibilidades na frente de batalha; o inimigo estava por todo o lado; isso
fazia sua mente dar um terrível nó e se exaurir. Cansado de planejar as
batalhas e aborrecido, o rei dispensou o general, pediu para que ele cuidasse
do resto. “Pouco me importo com o resultado dessas batalhas”: pensou o rei; mas
na verdade se importava. Ele era o rei de um povo, milhares de pessoas
dependiam dele; ah e seus pais... Se estivessem vivos o que pensariam deste
reinado que ele estava levando? O reinado de um louco com certeza! O povo
passava fome lá fora, o inimigo se aproximava, destruía vilarejos, estava tudo
errado... Tudo errado. Enquanto o caos e os conflitos se espalhavam
generalizados pelo reino, o rei permanecia lá no conforto de sua casa, seu
castelo; mas no desconforto de sua mente, seu templo. As imagens de um reino
miserável iam e vinham em sua mente sem parar, os sons de gritos agonizantes
bailavam no ar. Então sua mente lutava, ele pensava em salvar o reino, fazer
história, ser um grande rei pra sempre lembrado. Isso o confortava; fazia
planos e planos para o reino, enquanto a realidade ia sendo distorcida; por fim
não sabia mais o que era real. Para livrar-se da terrível culpa e da
responsabilidade, usava a imaginação; mas as notícias dos desastres do país
sempre chegavam aos seus ouvidos, fazendo-o desabar, voltar para desesperança,
alimentando um ciclo sem fim. No meio deste nevoeiro de sentimentos a majestade
estava na banheira deixando a água bater em suas costas e escorrer. Tornou-se
cônscio da natureza de seus pensamentos. As águas limpam o corpo e a alma; o
movimento das águas na banheira era como um reajuste mental, suave e sereno. Pequenas ondas se formavam ao redor do centro de tudo isto, que
coincidia exatamente com o corpo do rei. O nevoeiro se tornou visível,
iluminado; os nós se desfizeram; o corpo sentiu a água de um jeito totalmente
novo... Ah! Que tranqüilidade! Que sensação! Há quanto tempo não sentia a água assim... Aquele homem sorriu repentinamente. Os defuntos morreram, os vivos viveram, e a história começou
novamente do início. Um dia a história chegará ao fim.