Saturday, September 22, 2012

Rede de ilusões (conto)


O rei sentou-se na cama e leu os jornais. Mais tarde trouxeram-lhe café; com pouco açúcar e um bolo de morango bastante apetitoso. Comeu somente a metade, bebericou o café e olhou para os empregados que fizeram cara feia enquanto o rei que não gostara do café resmungava: “será possível que não se encontra ninguém que saiba trabalhar direito”. Ficou na cama até tarde; levantou-se apenas na hora de jogar golfe. Começou fazendo belas tacadas; na primeira bateu com tanta precisão que sorriu para si mesmo. Mas logo se cansou, queria público, não podia jogar sozinho apenas ele e um empregado que carregava o material esportivo. 
O rei voltou para casa e foi planejar as batalhas com seu general ao seu lado. O rei considerava o general um verdadeiro hipócrita, via claramente a falsidade naquele sorriso morto. Entre vários pensamentos o rei movia as peças de um tabuleiro de um lado para o outro; enquanto o general dava sugestões. A mente da majestade divagava, pensando em diversas possibilidades na frente de batalha; o inimigo estava por todo o lado; isso fazia sua mente dar um terrível nó e se exaurir. Cansado de planejar as batalhas e aborrecido, o rei dispensou o general, pediu para que ele cuidasse do resto. “Pouco me importo com o resultado dessas batalhas”: pensou o rei; mas na verdade se importava. Ele era o rei de um povo, milhares de pessoas dependiam dele; ah e seus pais... Se estivessem vivos o que pensariam deste reinado que ele estava levando? O reinado de um louco com certeza! O povo passava fome lá fora, o inimigo se aproximava, destruía vilarejos, estava tudo errado... Tudo errado. Enquanto o caos e os conflitos se espalhavam generalizados pelo reino, o rei permanecia lá no conforto de sua casa, seu castelo; mas no desconforto de sua mente, seu templo. As imagens de um reino miserável iam e vinham em sua mente sem parar, os sons de gritos agonizantes bailavam no ar. Então sua mente lutava, ele pensava em salvar o reino, fazer história, ser um grande rei pra sempre lembrado. Isso o confortava; fazia planos e planos para o reino, enquanto a realidade ia sendo distorcida; por fim não sabia mais o que era real. Para livrar-se da terrível culpa e da responsabilidade, usava a imaginação; mas as notícias dos desastres do país sempre chegavam aos seus ouvidos, fazendo-o desabar, voltar para desesperança, alimentando um ciclo sem fim. No meio deste nevoeiro de sentimentos a majestade estava na banheira deixando a água bater em suas costas e escorrer. Tornou-se cônscio da natureza de seus pensamentos. As águas limpam o corpo e a alma; o movimento das águas na banheira era como um reajuste mental, suave e sereno. Pequenas ondas se formavam ao redor do centro de tudo isto, que coincidia exatamente com o corpo do rei. O nevoeiro se tornou visível, iluminado; os nós se desfizeram; o corpo sentiu a água de um jeito totalmente novo... Ah! Que tranqüilidade! Que sensação! Há quanto tempo não sentia a água assim... Aquele homem sorriu repentinamente. Os defuntos morreram, os vivos viveram, e a história começou novamente do início. Um dia a história chegará ao fim.