Thursday, August 23, 2012

Novos e estranhos tempos - (conto)



O urso estava esperando as trutas descerem rio abaixo, elas estavam previstas para chegar quando o sol percorresse 3/4 do trajeto no céu, seriam centenas delas, um delicioso banquete que só um ser imponente como ele poderia desfrutar. As trutas vieram e o urso as pescava com enorme destreza; não deixava que elas escapulissem de suas garras, e devorava-as sem piedade. Contudo, em pouco tempo, o sol desceu montanha abaixo, foi se embora e com ele foram-se também as trutas; o urso comeu sua ultima truta, suculenta e carnuda despertando as melhores sensações que uma garganta poderia ter. As trutas não voltariam mais naquele dia, isso causava certa indignação no urso, mas pelo menos ele sabia que elas voltariam no dia seguinte; isto era um grande consolo. Elas sempre voltavam todas as tardes, desde que o urso se lembrava; graças aos deuses que os antigos haviam notado que as trutas sempre apareciam em certo horário do dia, agora ele podia saber quando elas iam voltar, e isso o deixava mais seguro. Mas por causa das trutas o grande urso nunca havia saído dos vales do norte, ele sabia que ali teria seu precioso alimento diário rico em todos os tipos de vitaminas que ele conhecia. De longe ele apenas avistava cadeias de montanhas ao sul, e uma luz lilás que aparecia no céu todas as noites. Que luz bela, cheia de vida, completa em sua magnificência, que luz seria aquela? Seriam os espíritos de seus ancestrais? Ou quem sabe, um portal para outro mundo. Não saberia, pois habitava a montanha da morte, e de lá não sairia; devorava a carne das trutas; e as trutas devoravam-lhe a alma.
Até que numa certa tarde ensolarada o pesado urso estava ansioso a esperar por mais uma edição de seu esplendoroso banquete, quando os peixes não vieram. Algo muito estranho havia acontecido no topo da montanha da morte para mudar o rumo natural das coisas; e o grande mamífero precisava se preparar para uma nova vida, se habituar a um novo lugar. Ele parou deprimido diante das águas a observar a correnteza forte do rio que tanto o alimentou, mas agora o desamparava; o deixava completamente perdido, sem destino, sem paradeiro, sem proteção. Pelos deuses, o que havia feito para merecer isto? Da noite para o dia perderá tudo que era mais importante para sua vida de urso. Em frente ao rio permaneceu imóvel durante oito dias, até que a fome o castigou. Sentia pontadas fortes na boca do estômago, precisava se alimentar urgentemente. Tomado por um profundo e misterioso Insight o urso se levantou, com o olhar fixo no horizonte, bebeu um pouco da água do rio e partiu rumo ao incerto.